“A cavalaria brasileira foi muito incompetente. Competente, sim, foi a cavalaria norte-americana, que dizimou seus índios no passado e hoje em dia não tem esse problema no país”, afirmou o então deputado federal Jair Bolsonaro no plenário da Câmara, em 1998. Passados 24 anos, esse mesmo senhor - alçado à presidência por ocasiões inadvertidas - foi condecorado com a Medalha do Mérito Indigenista “como reconhecimento pelos serviços relevantes em caráter altruísticos, relacionados com o bem-estar, a proteção e a defesa das comunidades indígenas”.
Seria louvável se, ao longo das mais de duas décadas que se passaram, Bolsonaro tivesse não só mudado sua concepção, como também encabeçado campanhas em defesa dos povos indígenas e, justamente por isso, fosse merecidamente condecorado com a Medalha do Mérito Indigenista. Mas não foi nada disso que aconteceu.
Somente no ano passado, Jair Bolsonaro foi denunciado em Haia duas vezes por crimes contra a humanidade e genocídio por ter incentivado invasão de terras indígenas por garimpeiros.
Fazendo um resgate das declarações públicas que o atual mandatário já fez sobre os indígenas, ademais; não fica difícil perceber que “serviços relevantes em caráter altruísticos, relacionados com o bem-estar, a proteção e a defesa das comunidades indígenas” não foi bem o que Bolsonaro promoveu ao longo de sua vida, principalmente depois que tomou posse como presidente.
Em 2018, durante sua campanha eleitoral, condenou a demarcação de terras indígenas sob o argumento de que índios em reservas são como animais em zoológicos. E ainda emendou: “Cada vez mais, o índio é um ser humano igual a nós”.
No discurso de abertura da ONU, em 2020, ele fez questão de, em uma fala confusa e delirante, culpar indígenas e caboclos pelas queimadas no Pantanal. E, em agosto do ano seguinte, afirmou à Rádio 96 FM, de Natal (RN), que grande parte dos indígenas “não sabe nem o que é dinheiro”.
Aos seus apoiadores, já disse barbaridades, como “índio não fala nossa língua, não tem dinheiro, é um pobre coitado”; “tem que ser integrado à sociedade, não criado em zoológicos milionários” e “tem índio yanomami falando inglês melhor do que professor”.
Para piorar, ultimamente Bolsonaro vem encabeçando campanhas para autorizar o garimpo em terras demarcadas. Em decreto assinado em 14 de fevereiro, por exemplo, chegou até a criar uma nova modalidade de exploração de terras: a mineração artesanal, que facilitaria essa extração ilegal nas terras indígenas.
Para mais, o atual chefe do executivo usou a guerra entre Ucrânia e Rússia para defender a mineração nas terras indígenas, dizendo que a exploração desses locais supriria a escassez de potássio proveniente dos fertilizantes deixados de ser importados da Rússia. Especialistas em engenharia de produção e meio ambiente, no entanto, são praticamente unânimes em contradizer o presidente. Para eles, mudar a lei para explorar essas áreas não é uma solução, e sim a causa de enormes problemas socioambientais.
Contudo, não é novidade que Bolsonaro ignora especialistas e age por interesse próprio. A depender dele, o Brasil pode se desmanchar em miséria e barafunda, desde que ele e sua prole continuem desfrutando do erário público e da segurança do foro privilegiado.
À vista disso, não seria surpreendente se algum parlamentar, ao comentar a conjuntura política e econômica atual, afirmasse em plenário: competentes foram os revolucionários franceses, que decapitaram seu tirano.
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