A recente entrevista do humorista e influenciador Whindersson Nunes ao "Fantástico", da Rede Globo, trouxe a público um lado pouco discutido da superdotação: os desafios e as dores que podem acompanhar as altas habilidades. Longe do glamour da genialidade, essa condição neurobiológica pode impor um fardo pesado, marcado por incompreensão, isolamento e uma intensa pressão interna.
“Vejo esta condição como uma orquestra de habilidades e sensibilidades únicas. Se todos os instrumentos não estiverem bem afinados, a melodia da vida pode ser arruinada”, afirma o psicólogo e hipnoterapeuta Thiago de Paula, que também é pai de um menino de 7 anos diagnosticado com superdotação. “Muitas vezes, o preço que se paga por ter destaque extremo em uma área da vida é alto demais.”
Segundo o especialista, é urgente ampliar o debate sobre o tema, especialmente considerando que, além dos 5 mil superdotados identificados pela Associação Mensa Brasil, há um número expressivo de casos subnotificados no país.
Um QI elevado e uma capacidade intelectual aguçada podem vir acompanhados de uma série de desafios emocionais e sociais. “Não é incomum que indivíduos com superdotação experimentem a solidão e o isolamento. Eles se sentem diferentes e incompreendidos, com interesses e um ritmo de pensamento que nem sempre se alinham com as pessoas em sua volta”, explica de Paula.
A importância do diagnóstico
Essa sensação de desconexão pode levar a quadros de depressão e ansiedade, agravados por um perfeccionismo extremo e uma percepção aguçada das injustiças do mundo. “A constante busca por significado e a frustração com a lentidão das outras pessoas ou com a falta de desafios podem acabar em transtornos depressivos ou ansiosos”, aponta o psicólogo.
Outras consequências incluem impulsividade e tédio crônico. A rapidez do processamento mental exige estimulação constante, levando a uma busca incessante por novos desafios e a uma sensação de descontentamento que pode se manifestar em mudanças frequentes de emprego, profissão e interesses.
Para Thiago de Paula, o diagnóstico correto é um passo fundamental para o bem-estar do indivíduo. “É como ter um mapa para uma jornada complexa. A validação e o autoconhecimento permitem que a pessoa entenda que suas diferenças não são falhas, mas sim características de sua neurodiversidade”, relata.
Um diagnóstico preciso, segundo ele, alivia sentimentos de inadequação, fortalece a autoestima e previne equívocos comuns, como confundir o tédio com desatenção (TDAH) ou a alta energia com hiperatividade. Com isso, é possível implementar estratégias mais eficientes na escola, no trabalho e no tratamento clínico.
Encontrar um caminho para que pessoas com QI elevado possam prosperar sem anular sua essência é o principal objetivo. “Imagina um carro de corrida rodando em uma rua normal. É preciso fazer ajustes para que ele use toda a sua potência sem correr riscos”, compara o especialista.
Embora cada caso seja único, algumas características são frequentes em pessoas com superdotação. Entre elas, Thiago de Paula destaca a aprendizagem rápida, a memória excepcional, a curiosidade intensa e a capacidade de fazer conexões complexas e compreender conceitos abstratos desde cedo.
“É uma sede quase insaciável por conhecimento e uma tendência a questionar ‘mas por quê?’ ou a pensar ‘e se?’”, explica o psicólogo, que viu o próprio filho andar aos 8 meses, falar as primeiras palavras aos 9 e formar frases complexas antes de completar 1 ano.
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